É provável que você se sinta inseguro se lhe for sugerida uma sessão de hipnose. Ainda existe muita insegurança por parte do público em relação a esta abordagem terapêutica. Menos por culpa do procedimento e mais pelo uso indevido que se faz dele – a chamada “hipnose de palco”, que declaradamente é um desserviço à humanidade, ao expor as pessoas a situações constrangedoras. A maior parte do descrédito com o método vem daí. Do medo de perder o controle e ficar completamente suscetível aos mandos e desmandos de alguém. Mas hipnose é muito mais que este ângulo, pequeno e com pouco sentido.
Super atenção
O outro, e que um público menos numeroso conhece, é que existem métodos de hipnose clínica praticada por médicos, psicólogos e dentistas, com um profundo ganho para a nossa saúde. Estas não têm nada de obscuro. Pelo contrário, os seus efeitos estão a ser investigados à luz da ciência. Nos Estados Unidos, pesquisas na Universidade Harvard demonstraram que o transe hipnótico pode diminuir o stress de mulheres que vão submeter-se a uma biopsia. No Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, um dos centros de tratamento de cancro mais respeitados do mundo, com sede em Nova York, os médicos ensinam a auto-hipnose ao paciente como forma de reduzir o enjoo típico da quimioterapia.
Aval da ciência
Reconhecida pelos conselhos de medicina, psicologia e odontologia, a hipnose médica é um coadjuvante no tratamento de diferentes males. Especialmente os de origem psicossomática, como a ansiedade, fobia, dores crónicas ou agudas. “Em muitos países, a credibilidade da hipnose é alta. No entanto ainda prevalece uma certa rejeição por parte de médicos e pacientes. É uma pena porque o método realmente é interessante e efetivo”, diz Paulo de Tarso Lima, responsável pelo setor de medicina integrativa do Hospital Israelita Albert Einstein. “Mas também é verdade que faltam bons profissionais a quem recorrer.”
Um estudo recente, publicado pela revista Radiologia Brasileira, e orientado por especialistas do Hospital São Camilo, provou que esta é um recurso importante para o controle da claustrofobia durante os exames de ressonância magnética.
A ideia foi do cardiologista Luiz Velloso, “Frequentemente sou procurado por pacientes que precisam ser sedados para fazer a ressonância magnética. Alguns desmaiam somente em ver o aparelho. A sedação, contudo, prejudica o bom resultado do exame porque, durante o procedimento, é preciso que o paciente siga algumas instruções, como suster a respiração por alguns segundos. Sedado, ele simplesmente adormece e não colabora. Por tudo isso, pensei em usar a hipnose”, diz Velloso.
O sucesso – 90% dos pacientes claustrofóbicos hipnotizados conseguiram fazer o exame – levou a equipa e a ampliar a pesquisa.
Sem preconceitos
Por causa do interesse científico, aos poucos a resistência ao este procedimento vai sendo substituída pela informação. “Antes de tudo, é preciso esclarecer que hipnose é um processo fisiológico natural que ocorre várias vezes no nosso dia-a-dia. Acontece, por exemplo, quando você está a adormecer e quando está a acordar devagarinho. Ou ainda, quando você liga o carro e, sem perceber como, chega ao destino”, diz a psicoterapeuta Isabel Labate, que faz uso da indução hipnótica há 25 anos e coordena um curso de extensão sobre o assunto na PUC-SP.
“Não bater com o carro durante o seu percurso indica que você não caiu em sono profundo; sabe que está ao volante, mas com o foco noutro lugar”, afirma Isabel. Essa constatação derruba um dos maiores temores em relação à técnica: o paciente mantém-se consciente e, portanto, não fará nada que não queira. “O que propicia a indução e a manutenção do estado hipnótico é a empatia entre o paciente e o psicoterapeuta, e uma relação de confiança estabelecida muito antes da sessão. Se durante o transe o hipnotizador falar algo que agrida os valores, os princípios e a moral do paciente, como a atenção e a memória dele estão alertas, ele cortará imediatamente a ligação.” Ou seja, prevalece a vontade do paciente. Só existe transe hipnótico quando ele está disposto a seguir a orientação do terapeuta.
Profissionais qualificados
No transe induzido, o paciente é convidado a tirar o foco de uma área – estímulos externos, por exemplo – e a prestar mais atenção em outra – como as sensações que vêm do corpo. E quando a atenção não fica a divagar de um lugar para o outro, o mergulho em memórias reprimidas e cristalizadas é mais provável e mais profundo. Daí a importância da experiência e da idoneidade do hipnotizador, que poderá mexer em registos preciosos e sugerir ao cérebro algumas mudanças.
Com exames modernos como o PET Scan e a tomografia funcional, hoje, finalmente, constata-se que durante o transe pode haver uma modificação da informação cerebral. Justamente por isso é possível, por exemplo, usar a hipnose no controle do peso, dizendo a alguém num momento de transe que a partir daí ela vai comer mais alimentos saudáveis e se sentir satisfeita com apenas algumas garfadas. Mas não se trata de um milagre. “Hipnose é a indução a uma convicção. Tem de ter alguma lógica para o paciente, ir de encontro às suas convicções ou nada feito”, afirma Luiz Velloso. Além disso, sozinha, a técnica não oferece garantias de sucesso. É necessário conciliá-la com outras providências. No caso da obesidade, recorrer a um nutricionista, por exemplo.
Contra-indicações
O transe é proibido em pacientes psicóticos, por exemplo, porque pode desencadear uma crise. No caso de atletas que tentam abolir o cansaço e superar os seus limites, a prática pode causar lesões por overtraining. E, finalmente, remover um sintoma sem saber a que ele serve é, no mínimo, uma má conduta. “A pessoa responde mais facilmente aos estímulos quando está em transe. Então, se relata uma dor crónica em forma de pontadas, posso mudar a sensação para a de peso, depois uma discreta dormência perfeitamente suportável, o que é interessante e útil”. O que não se pode fazer é ir além e eliminar o desconforto, enquanto a causa não for identificada. “Seria o mesmo que retirar uma dor de dentes e não perceber que o canal está infectado”.
Esta prudência deve ser a base de todo o tratamento. Por isso, é necessário encontrar um hipnoterapeuta de confiança e verificar a sua capacidade e credibilidade.
Fonte: actinstitute.org